Quem é o produtor de RO que investiu em cacau ‘rejeitado’ e acabou premiado em concurso nacional de qualidade

Pós-colheita rigorosoa foi um dos principais motivos que levaram Deoclides ao topo do Concurso Nacional de Qualidade do Cacau do Brasil.

Por G1

Publicado em:

Quando Deoclides Pires da Silva era criança e acompanhava seu pai no cultivo de cacau na zona rural de Jaru (RO), não imaginava que anos depois, receberia um importante reconhecimento nacional pela produção do fruto.

Neste ano, ele subiu no lugar mais alto do pódio e conquistou o 1º lugar do Concurso Nacional de Qualidade do Cacau Especial do Brasil. Com a vitória, ele carimbou a ida para o Cocoa of Excellence, que premia as melhores amêndoas de cacau do mundo.

O sucesso é resultado de um trabalho de anos, que envolve melhoramento genético de sementes e novas técnicas de produção, além de muita dedicação e amor pelo cacau.

Pragas, vida fora do campo e o sonho do cacau perfeito
A vida de Deoclides está ligada ao cacau há muitos anos. Quando era criança, viu seu pai investir muito dinheiro na produção da fruta, mas já sabia que quando crescesse, a cultivaria de uma forma diferente.

“Na década de 70, nós trabalhamos com cacau. Meu pai pegou um financiamento e a gente plantou. Na época, a gente tinha que obedecer ao meu pai, mas meu plano sempre foi plantar cacau de um jeito diferente”, diz.

Foi a chegada da praga conhecida como ‘vassoura de bruxa’, que devastou lavouras em todo o país, que adiou a realização do sonho do pai de Deoclides. Sem plantação, o jovem saiu do campo e foi para a cidade, mas com a certeza de que um dia voltaria para mudar a história do cacau no estado.

“Veio a vassoura de bruxa e eliminou tudo, aí eu me mudei pra cidade. Trabalhei um tempo de empregado, abri um comércio para mim e chegou um tempo que eu cansei de trabalhar no comércio e eu já tinha um projeto de trabalhar com cacau, de fazer ele tecnificado. Comecei a fazer pesquisa na internet, de como era e aí, decidi apostar nesse cacau”, conta.

Em 2016, o produtor plantou os primeiros pés de cacau em sua propriedade e ano passado, ele colheu cerca de cinco toneladas do fruto.

Rejeitado na Bahia, amado na Amazônia: CCN51

Há mais de 5 mil anos, o cacau já era degustado na Amazônia. Daqui, ele foi enviado para o nordeste brasileiro e na Bahia, se tornou referência de produção para o país.

Mesmo não sendo o maior produtor do país, municípios de Rondônia foram batizados com o seu nome, como Theobroma, Cacaulândia e Cacoal, e no estado, o cacau se tornou a 2ª cultura permanente com maior área destinada à colheita.

Em Jaru, Deoclides optou por cultivar a variedade CCN51, mas teve gente que torceu o nariz com a escolha.

“Eu, quando plantei essa variedade, não sabia que na Bahia, ele era rejeitado. Ele era rotulado que não dava chocolate, apesar de ser cacau de alta produtividade e um cacau fácil de manusear, ele não é aceito na região da Bahia, por não dar chocolate”, revela Deoclides.

Foi a visita de Adriana Reis, gerente de qualidade do Centro de Inovações do cacau e líder do Painel Sensorial do BCA22, que mudou o pensamento do produtor rondoniense. Em 2021, ela visitou a propriedade de Deoclides e deixou um desafio para ele.

“Ano passado, ela [Adriana] experimentou nossas amêndoas de cacau e falou o seguinte: “Realmente, o cacau de vocês aqui de Rondônia é diferente. Agora só tem um porém, vocês vão ter que provar para o mundo que ele é diferente”. E esse ano chegou e nós conseguimos provar”, diz Deoclides.

O segredo do sucesso: pós-colheita
Adriana Reis explica que “Rondônia tem um perfil sensorial diferenciado” e isso permite que uma variedade que não é bem vista no nordeste brasileiro, faça sucesso no norte do país. Mas além disso, o cuidado e a dedicação de Deoclides fizeram toda a diferença para que o resultado fosse positivo.

“Eu acho que nesse caso, teve a união de um bom trabalho e um comprometimento em campo do produtor, no caso do Deoclides, estimulando o melhor de uma variedade que não é tão positiva pra sabor”, explica Adriana.

O segredo para o sucesso de Deoclides com a CCN51 está no pós-colheita, já que segundo Adriana, esta espécie precisa de um “protocolo específico”.

“Ele foi bem trabalhado na pós colheita, foi aplicado um protocolo específico. O produtor se dedicou a trabalhar, ao longo de 1 ano na pós colheita certa para a variedade”, diz.

Sabor diferente
O Brasil foi reconhecido pela Organização Internacional do Cacau (ICCO, na sigla em inglês) como um país exportador de 100% de cacau fino, em 2019. Para isso, o cacau precisa transportar para o paladar suas características originais: sabores florais, frutados e amadeirados.

De acordo com a Adriana, a variedade escolhida por Deoclides é criticada justamente por não oferecer um sabor propício para a produção de chocolates finos.

“Ela é muito criticada porque ela tem pontos negativos principalmente em acidez, ela tende a ter notas de acidez mineral”, explica a especialista.

Mas foi o sucesso no pós-colheita que garantiu que Deoclides reduzisse a acidez da amêndoa e garantisse o primeiro lugar na competição nacional.

“A gente teve uma grata surpresa, premiando uma variedade tão exótica, tão criticada, mas o mérito vai todo para ele”, finaliza Adriana.

Fonte: G1

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.