O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) cobra dos partidos políticos mais responsabilidade na administração de recursos públicos por um tipo de gasto que o próprio tribunal também fez recorrentemente nos últimos cinco anos.
São as chamadas despesas com “no-show” (não comparecimento em embarques) e com taxas por cancelamento e remarcação de passagens aéreas.
Informações obtidas pela reportagem por meio da Lei de Acesso à Informação apontam que, de 2016 a 2020, o tribunal desembolsou R$ 104.694,71 com esses pagamentos. Os dados não discriminam se os gastos foram feitos por ministros ou pelos servidores do tribunal.
Nos últimos anos, partidos têm recebido reprimendas por suposto mau uso de dinheiro público quando usam verba do fundo público partidário para despesas desse gênero.
Só partir de abril do ano passado, em meio à pandemia do novo coronavírus, esses gastos em voos perdidos ou remarcados foram interrompidos pelo TSE. Procurado, o tribunal afirma que as ausências em embarques, quando não justificadas, têm que ser ressarcidas.
O precedente aplicado aos partidos sobre o tema no TSE foi um acórdão de 2015 relatado pelo ministro Gilmar Mendes, referente às contas de 2009 do PSC. O caso em questão era relativo ao pagamento de no-show no aluguel de uma van, e não a voos de avião.
“É preciso responsabilidade na administração de recursos públicos, portanto a agremiação partidária deveria ter diligenciado para informar o cancelamento da reserva e assim evitar a cobrança da citada tarifa”, diz o documento do TSE.
O precedente foi, por exemplo, usado em 2019, em um processo de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente da corte eleitoral, para reconhecer uma irregularidade nas contas de 2013 do antigo PTN (atual Podemos) com gastos com no-show de passagens aéreas. Barroso é o atual presidente do TSE.
Segundo Barroso, a ocorrência de no-show “caracteriza mau uso dos recursos do fundo partidário, uma vez que geram a cobrança de valores à agremiação por serviços que não foram efetivamente prestados”.
O ministro destacou que “o partido reconhece a falha e se compromete a restituir os valores apontados aos cofres públicos”. Pelo no-show, o Podemos devolveu pouco mais de R$ 4.000. As contas foram aprovadas com ressalvas.
Ano passado, o ministro Edson Fachin também relatou as contas do antigo PMDB (atual MDB) de 2015 e pediu ressarcimento aos cofres públicos de R$ 15.596,76, que incluíam tanto o no-show como multas de passagens aéreas.
“Houve o dispêndio de verbas públicas, e o destinatário do serviço deixou de utilizá-lo, sem apresentação de explicações e justificativas. Nessas situações, o gasto é irregular porque carece de vínculo com a efetiva realização da despesa”, disse Fachin.
Na ocasião, o partido também se comprometeu a ressarcir o dinheiro utilizado. As normas de gerais gastos do fundo público partidário estão previstas na Lei dos Partidos políticos.
As despesas do TSE com no-show e remarcações ou cancelamentos eram mais altas até 2018 e caíram significativamente em 2019, ano-pós-eleitoral, e em 2020, quando a pandemia começou.
De acordo com os dados de 2015 a 2020 enviados pelo órgão via Lei de Acesso à Informação, nesse período 2017 foi o ano em que mais se gastou com no-show e remarcações ou cancelamentos. Foram R$ 3.555 gastos com taxas de remarcações e cancelamentos e R$ 37.314 com no-show.
Já em 2019, ano em que houve menor gasto, foram R$ 840 desembolsados com remarcações e cancelamentos e R$ 3.068 com no-show. Junho de 2016 foi o mês em que mais houve despesas. Foram desembolsados R$ 10.512 com essas tarifas.
Dos R$ 104 mil usados nesse tipo de despesa durante o período, R$ 88 mil foram com no-show e o restante com cancelamentos e remarcações.
TSE cita resolução e afirma que valores devem ser ressarcidos.
Outro lado
Procurado, o TSE informa por meio da área técnica que resolução do Tribunal de 2010 afirma que o beneficiário deve ressarcir valores que deixarem de ser reembolsados em virtude do cancelamento de viagem ou no-show “alvo comprovada ocorrência de caso fortuito, força maior ou interesse da administração”.
Questionado, porém, o TSE não informa se houve algum valor ressarcido nesses R$ 104 mil. O órgão diz que “a emissão de passagens aéreas segue as determinações internas” de resolução. “Todas as solicitações devem ser feitas em formulário próprio, constante do SEI [Sistema Eletrônico de Informações], em que os requisitantes são informados das regras estabelecidas que visam sempre o menor custo a ser despendido pela administração pública”, diz a área técnica em nota.”
“[É] esclarecido aos requisitantes que a compra da passagem deverá priorizar a de menor preço, recaindo prioritariamente em percurso de menor duração e considerando o horário e o período da participação do servidor no evento. Quando não houver a opção pela passagem de menor valor, deverá ser devidamente justificado.”
Os requisitantes têm que inserir no SEI as informações do cartão de embarque em até cinco dias e encaminhar à seção de prestação de contas.
“Faz parte da rotina dos servidores responsáveis pela emissão de passagens orientar os requisitantes com relação a prazos e procedimentos”, diz o TSE. “Durante o acompanhamento da execução do contrato de fornecimento de passagens aéreas, os fiscais constantemente propõem melhorias nos procedimentos, a partir das lições aprendidas.”