Nova espécie de tartaruga de água doce é encontrada em região da Amazônia

Com participação ativa de ribeirinhos, pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), juntamente com Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia ...

Por O eco

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Com participação ativa de ribeirinhos, pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), juntamente com Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), descreveram uma nova espécie de tartaruga de água doce na Amazônia. A pesquisa acaba de ser publicada na última edição da revista científica Chelonian Conservation and Biology. Com a nova informação, agora são 33 espécies de tartarugas de água doce no Brasil.

A nova espécie foi encontrada em Juruti, município do Pará em 2018 e por três anos os pesquisadores analisaram características morfológicas e moleculares para que fosse oficializada a descoberta. Chamada de Mesoclemmys jurutiensis, em homenagem ao município onde foi encontrada, a tartaruga vive em poças temporárias formadas por água da chuva dentro da floresta fechada e, pelo que se sabe, alimenta-se de girinos e insetos aquáticos.

Fábio Andrew Cunha, mestre em Biologia de Água Doce pelo INPA e atualmente doutorando em Ecologia Aquática e Pesca pela UFPA, foi um dos pesquisadores que participaram do estudo e explica a importância da descoberta. De acordo com biólogo, a região amazônica é um “hotspot turtles”, ou seja, um ambiente rico em diversidade deste grupo, além de possuir um alto endemismo, pois muitas espécies existem apenas ali. A Amazônia é considerada, então, uma área prioritária para conservação das tartarugas do planeta e, sendo assim, é essencial ter conhecimento sobre suas espécies.

“Somente com o conhecimento da biodiversidade de uma determinada região é possível construir políticas públicas voltadas para a conservação e preservação das espécies, sem isso, não podemos dizer e nem tampouco mensurar quais os riscos ou prejuízos à biodiversidade com a degradação daquele ambiente”, diz o pesquisador.

A descoberta

Por meio de um e-mail sobre sua recente descoberta no mundo da biologia, Fábio conta seu percurso ao lados das tartarugas, grupo este que desde antes de entrar na faculdade de biologia, já era fascinado. Ainda na graduação, teve contato com a pesquisa científica e adentrou inteiramente nesse mundo, dedicando-se à taxonomia, ecologia e história natural.

Por esse caminho resolveu traçar sua vida acadêmica e, por conta disso, encontra-se sempre em uma rotina de pesquisa de campo. E assim estava no dia 9 de março de 2018, dia que andava por poças de chuva em uma região do município de Juruti, procurando espécies de tartarugas de água doce, até o momento que, por um acaso, fez uma descoberta de grande importância para a biodiversidade amazônica.

“Quando entrei na poça, primeiramente, senti algo com o pé, quando mergulhei e toquei com as mãos percebi que era grande e, por conhecer as espécies, fiquei surpreso pois, pelo tamanho, eu sabia que era diferente de tudo aquilo que ali buscava.”

“Quando retirei o animal da água e vi, dei um grito alto. Todos se assustaram. Foi naquele momento que descobri que se tratava de uma nova espécie”, conta o pesquisador.

Em momentos como esse, apesar de grande entusiasmo, é necessário seguir os protocolos científicos para que a descoberta seja oficializada. Ao chegarem do campo com as tartarugas, eles já sabiam que se tratava de algo novo para a ciência, mas ainda precisavam passar pelo processo de descrição da espécie. Foi feita morfometria, que são as mensurações dos animais, descrições do organismo, morfologia e análise do material genético.

Fábio conta que para a descrição de uma nova espécie, principalmente se ela for de grande porte, como uma tartaruga, é obrigatório a comparação do novo táxon com seus semelhantes mais próximos, que podem ser espécies dentro do mesmo gênero, gêneros dentro da mesma família, e assim por diante.

O pesquisador Fábio Cunha com a Mesoclemmys jurutiensis em uma poça de água da chuva, local onde ela é encontrada. 

“O processo é minucioso, delicado e lento, desde a primeira captura até a publicação é um período longo. Esse processo é extremamente importante e necessário, pois a ciência se constrói com dados e, quanto mais robustos forem os dados, melhor para garantir que a hipótese científica seja aceita, no nosso caso, a descrição de uma nova espécie de tartaruga de água doce.”

E foi a partir desse processo que perceberam as diferenças da Mesoclemmys jurutiensis entre tudo que já era conhecido.

Ela é distinguível pelo seu tamanho corporal: é um dos menores membros amazônicos do gênero Mesoclemmys, onde apenas Mesoclemmys gibba é menor. No processo de pesquisa, a maior espécime encontrada foi uma fêmea adulta de 22,8 centímetros. Além disso, ela possui carapaça (região superior do casco) em tonalidades avermelhadas e o plastrão (região inferior do casco) de coloração amarelo-queimado. Outra característica peculiar é a cabeça triangular com grandes olhos próximos às narinas.

Participação da comunidade

O biólogo conta como a comunidade ribeirinha teve uma participação importante no desenvolvimento da pesquisa, principalmente na região do Juruti-velho, na comunidade do Capiranga (zona rural do município), com ajuda na procura e captura dos animais.

“A comunidade ribeirinha teve um papel crucial nesse processo, pois, primeiramente, permitiu que eu pudesse me embrenhar em seu ‘quintal’ para poder pesquisar; segundo, pois participaram ativamente do processo de procura e captura dos animais, principalmente na comunidade do Capiranga, pois foi nessa região que concentramos as excursões para que pudéssemos encontrar mais indivíduos de Mesoclemmys jurutiensis, a fim de acrescentar ainda mais dados à pesquisa”.

Ele acredita que somente com conhecimento técnico-científico atrelado ao conhecimento tradicional, muitas descobertas foram possíveis e inúmeras outras estão por vir, afinal, é o ribeirinho que vivencia as narrativas ecológicas e acompanha as mudanças naquele ambiente.

“Eu, particularmente, acredito que as comunidades tradicionais são imprescindíveis no processo de descobertas e conservação na natureza”, completa.

Fonte: O eco

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