O aumento das taxas de juros traz consequências negativas para a economia, como o aumento do crédito para pessoas físicas e jurídicas, causando dificuldades de investimento e contratação. Nesse cenário, como em um “efeito dominó”, segundo especialistas ouvidos pela CNN, pode levar ao aumento do desemprego e à diminuição do ritmo da atividade econômica em geral.
“A atividade produtiva diminui, os custos do crédito aumentam, fica mais caro pedir dinheiro para comprar bens e serviços. Com isso, a produção e a demanda diminuem e a economia desacelera”, diz José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
A taxa básica de juros Selic está atualmente em 13,75%, o maior nível desde 2016.
Um aumento nas taxas de juros é uma ferramenta usada pelo banco central para conter a inflação. Apesar dos efeitos colaterais que podem ter sobre a economia, os economistas dizem que é um remédio necessário e um corte forçado de juros teria o efeito oposto sobre os preços.
“Antes de tudo, é importante entender por que o banco central aumenta as taxas de juros. Ele aumenta por um motivo específico, que é reduzir a inflação. Eles têm que reduzir a demanda. As consequências negativas são mecanismos de funcionamento para o recuo da inflação. Sem essas consequências, a inflação sobe e isso dificulta a vida de consumidores e produtores”, avalia Thais Zara, economista da LCA Consultores.
Além da alta taxa nominal, o Brasil continua a ter uma das maiores taxas de juros reais do mundo. O ranking foi elaborado pela Infinity Asset Management, que monitora um grupo das 40 principais economias mundiais. Os juros reais são a taxa de juros atual menos a inflação.
Outros países latinos lideram a lista das maiores taxas de juros reais, seguidos pelo Brasil: México tem uma taxa de inflação descontada de 5,5%, Chile 4,7% e Colômbia 3%.
Mercado de trabalho
José Márcio Camargo menciona que o mercado de trabalho também é um dos canais da economia que podem sofrer com os juros altos, uma vez que, o desaquecimento da economia faz com que empresas contratem menos e torna mais cara a manutenção de trabalhadores.
“O efeito negativo é um possível aumento da taxa de desemprego para segurar a demanda, mas é o que precisa para combater a inflação. É importante para o equilíbrio”, diz o especialista.
O próprio ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, apontou o impacto das taxas na geração de empregos.
Na última quinta-feira (09/03), Marinho destacou que o nível de endividamento das famílias e o comprometimento de renda em alta, somado ao aumento de despesas fixas em janeiro, levam as empresas a reduzir as contratações diante da expectativa de queda do consumo.
“Janeiro é tradicionalmente um mês forte. Em janeiro de 2023, temos uma política monetária ainda restritiva. O BC tem uma tarefa importante de monitorar o processo econômico para a retomada da economia. Os juros altos sacrificam demasiadamente a população de baixa renda do país”, disse ele.
Segundo um levantamento da Serasa Experian, o número de inadimplentes passou de 59,3 milhões, em janeiro de 2018, para 70,1 milhões, em janeiro de 2023 — recorde da série histórica.
Saúde empresarial
Os reflexos no mercado de trabalho estão ligados à saúde financeira das empresas. “Fica mais caro contratar quando a taxa de juros está alta. As empresas decidem ficar mais retraídas”, diz Thais Zara, economista da LCA Consultores.
Zara também afirma que o cenário atual torna ainda mais difícil a vida de empresas que possuem dívidas.
Na vida prática das empresas, os juros altos indicam a necessidade de se ter mais dinheiro para pagar dívidas, muitas vezes, contraídas num cenário em que a taxa estava perto da mínima, como era em 2021.
A dificuldade para conseguir crédito já é reconhecida pelo Comitê de Estabilidade Financeira (Comef), órgão do Banco Central. Em sua última reunião, a entidade apontou que houve desaceleração no ritmo de concessão de crédito tanto para empresas como para o consumidor pessoa física.
Já a consultoria Verde Asset apontou que existem sinais incipientes de uma possível crise de crédito atingindo a economia brasileira e que, por isso, será necessário “boas políticas públicas” para administrar a situação.
Em um cenário econômico delicado, o número de falências de empresas avançou 56,5% em janeiro deste ano, em relação ao mesmo mês do ano passado, segundo levantamento do Serasa Experian, de 46 pedidos para 72.
O aumento chega a 80% quando consideramos os 40 pedidos de falência registrados em janeiro de 2021.
Menor crescimento
Ao reduzir o consumo, a demanda, dificultar a obtenção de crédito e desestimular o investimento, a consequência mais significativa dos juros é a desaceleração econômica geral.
Uma queda de 0,2% no produto interno bruto (PIB) do país no quarto trimestre sugere que a economia continua desacelerando.
“Ainda que o resultado do ano tenha sido muito bom, também por estímulos governamentais por causa das eleições, a taxa de juros foi crucial para a desaceleração vista no quarto trimestre do ano passado. Essa queda de 0,2% já indica o que vai acontecer em 2023”, afirmou Juliana Trece, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
Regra fiscal
Mesmo com um cenário bastante desafiador, cresce o movimento no mercado de analistas que esperam uma queda na taxa básica antes do previsto, ainda no meio do ano.
Mas economistas avaliam que o governo precisa dar sinais claros de uma meta para o controle da dívida pública e também para o controle do crescimento do gasto público.
Eles citam a eminente chegada do arcabouço fiscal, que deve substituir o teto de gastos, e uma acomodação dos preços das commodities no exterior como importantes componentes para que se comece a discutir a redução da Selic.
“O balanço de riscos mudou, e já podemos começar a debater quando o processo de afrouxamento monetário pode começar”, aponta Rafaela Vitoria, economista-chefe do Inter.
Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, avalia que grande parte da desaceleração da economia vista no quarto trimestre de 2022 pode ser explicada pelo aperto na taxa de juros, “que começa a ganhar tons mais dramáticos agora”. “Olhando para frente, os próximos passos devem ser de corte na taxa de juros, principalmente se vier uma regra fiscal como parece que tem vindo adiante”, conclui.
“Se o BC tomar a decisão de abaixar a Selic dentro de um contexto técnico, em que ele analisa e pondera todos os fatores, é perfeitamente possível um cenário de queda de juros no futuro, não agora ou na próxima reunião, mas no meio do ano ou no segundo semestre, com a inflação convergindo”, afirma Gala.
A leitura de Antonio Lacerda, doutor em economia e professor da PUC-SP, é que o Banco Central pode começar a rever o patamar a partir do final deste semestre e começo do próximo, se o “contexto técnico” for propício.