O jacaré mantinha o seu olhar compenetrado. Até parecia que estava contemplando o pôr do sol à beira do corixo em que vive, e que está cada vez mais seco.
Ali com ele vivem outras centenas de jacarés, cada um buscando formas de sobreviver à seca no Pantanal. A água que antes era abundante e passava por debaixo da terceira ponte da Transpantaneira, em Mato Grosso, não existe mais.
E na condição em que as coisas estão, nos próximos dois ou três dias o que restou dela também vai desaparecer e deixará os animais sem qualquer opção, a não ser esperar a chuva, um resgate ou uma caminhão-pipa.
São tantos jacarés que é difícil imaginar como sobreviverão ali. Um deles, o jacaré que foi citado no início do texto, teve sua sorte mudada ao ser resgatado pelos veterinários do GRAD.
O animal estava debilitado, magro, a ponto de ser possível notá-lo em meio a tantos outros que estavam ao seu redor. A reação dele foi ínfima perto da força que estes répteis têm.
Sem muito trabalho, os profissionais levaram ele ao veículo, onde o medicaram durante um trajeto de quase 50 minutos até o Rio Pixaim, onde o soltaram.
Nos próximos dias, as organizações que atuam pela fauna pantaneira terão que definir uma estratégia para garantir o bem estar das centenas de jacarés que permaneceram lá.
A dinâmica é difícil, remanejar essa quantidade enorme de animais para outro lugar é algo que necessita de estudos, a fim de não causar desequilíbrio em outros territórios, já que a seca é a realidade do bioma. Contudo, o relógio não para. A água evapora. A comida fica mais escassa. A ação é urgente. Ao mesmo tempo, o recurso financeiro é pouco. A rotina é sob pressão. E o que motiva quem está atuando aqui é a compaixão.
O jacaré foi solto. E com a sua liberdade teve, novamente, a oportunidade de viver mais alguns anos. Ao deixá-lo ir, a veterinária Rafaela disse: “estar com esses bichos é bom demais”. É este o sentimento de quem entende que estar aqui é uma escolha, sobretudo, de amar o que faz e pra quem faz.